Ferruccio Laviani: uma vida de casualidades
Uma série de casualidades pontuou a carreira do arquiteto e designer Pietro Ferruccio Laviani, autor de ícones do design e diretor criativo de grandes marcas
O encontro de FLO Magazine com Pietro Ferruccio Laviani em seu estúdio em Milão é pontuado de surpresas. Arquiteto e designer, autor de ícones do design como as luminárias Orbital e Bourgie e diretor criativo de grandes marcas, Laviani, ao contrário do que se espera de uma figura tão importante, é simples e discreto. Ele conta que sua vida foi desenhada por uma sequência de casualidades. A começar pela escolha profissional. Nascido em 1960, em Cremona, na Lombardia, cidade do artesão Stradivari e do músico Monteverdi, deu o primeiro passo no mundo do mobiliário, nos anos 70, quando ingressou casualmente na escola técnica de “luthieria”, ou produção de instrumentos de corda. Depois de experimentar o curso, o qual Ferruccio não se afinou, transferiu-se para a seção de mobiliário, que a escola mantinha, onde aprendeu a desenhar e a construir móveis em madeira. Seu grande sonho era ser egiptólogo, mas não teve muita escolha, o pai o enviou para a faculdade de arquitetura do Politécnico de Milão. Aos 23 anos, também ao acaso – pois a data de apresentação de sua tese final fora postergada –, para ocupar o tempo livre, por recomendação de um amigo que conhecia o seu fascínio pelo movimento Memphis, passou a frequentar a contragosto do pai o Politecnico di Design. “Fui para escola e deu certo”, revela. Na mesma época, o encanto pelo Memphis levou Laviani para o escritório de Michele de Lucchi, um dos integrantes do grupo, o qual se associou aos 26 anos e onde teve contato com profissionais que exerceram grande influência em sua carreira, como Achille Castiglioni. Em 1991, abriu seu próprio estúdio e também foi contratado pela Kartell como diretor criativo, papel que exerceu em várias empresas ao longo dos anos como Flos, Foscarini, Moroso entre outras. Com seu time, ocupa-se de design de produto, gráfica e interiores. Projeta espaços e instalações comerciais, como stands, lojas, showrooms, para empresas como Cassina, Dolce&Gabbana, Missoni, Emilio Pucci, Veuve Clicquot, Renault, Samsung e outras. A casualidade também conduz a criação dos projetos de Ferruccio Laviani. A inspiração pode vir de um filme, da capa de um livro, de uma exposição... “A coisa que eu adoro projetar é quando chega alguma coisa nova na minha mesa. Isso é muito importante para o desenvolvimento da minha criatividade, da minha cabeça”, argumenta. Quem acompanha a sua carreira percebe que ele sempre se mimetizou em suas obras, seja como autor, seja como diretor criativo. “Eu fico muito mais orgulhoso de ver meu produto ou meu projeto, em ver minha cara”, esclarece. Numa trajetória longa e consolidada como diretor criativo, mais de 30 anos, por exemplo, em parceria com a Kartell, revela que um dos segredos do seu sucesso é nunca fazer a empresa com a cara do Laviani. “A Kartell com o Laviani, a Foscarini com o Laviani, a Flos com o Laviani...”, explica. - Ao longo do tempo, os projetos de Ferruccio Laviani viram ícones. Muitas de suas luminárias podem ser consideradas hoje clássicos, como a Orbital, criada para a Foscarini 1992, uma das peças preferidas até de Steve Jobs, que a mantinha quase solitária em seu escritório desprovido de excessos. Já a Bourgie, desenvolvida para a Kartell em 2004, tornou-se um ícone pelo seu tom irônico: de design barroco, mas feita de plástico. Além das luminárias, Laviani consagrou-se com móveis de madeira e outros materiais, inspirados no design radical do grupo Memphis, o qual também teve oportunidade de participar no início da carreira. Outra área em que o designer também se destaca são os acabamentos como papel de parede, tapetes e revestimento cerâmico. A cerâmica industrial é um de seus produtos preferidos, pois sua projetação envolve, segundo ele, tanto tecnologia quanto arte. Em sua última criação para a Lea Ceramiche, a coleção de grandes formatos Pigmenti, Laviani investigou as tonalidades dos centros históricos italianos, para chegar a uma paleta conceitual. Já para o aspecto da superfície, estudou as obras de artistas contemporâneos que trabalham com a textura do concreto. E não podem ser esquecidos, claro, os 33 estandes idealizados para a Kartell, sempre aguardados no Salone del Mobile, que fazem parte do rol de projetos assinados por Laviani que marcam uma era. - Fazer a ponte aérea Itália-Brasil durante alguns anos da década de 1990 também não foi programado na vida de Ferruccio Laviani. Graças a amizade que travou com o diretor de arte brasileiro Giovanni Bianco que, na época, residia em Milão, teve os primeiros contatos com o país e com os brasileiros. Dali surgiu o convite do empresário da moda Tufi Duek para Ferruccio desenvolver lojas, eventos e apresentações das grifes Forum e Triton. A história com o Brasil encerrou-se no fim dos anos 90, quando Tufi decidiu vender a empresa e a maior parte dos clientes de Ferruccio concentrava-se na Itália. Mas foi dessa época que criou vínculos duradouros com a nata do panorama artístico da década, como Bebel Gilberto, Marina Lima e Beth Prado. “Não vou dizer que me sinto metade brasileiro, não nasci lá, não tive um relacionamento verdadeiro de família, mas eu acho que um quarto de mim é brasileiro”, confessa seu amor pelo país. - Encerrando a entrevista para a FLO Magazine, Ferruccio Laviani fala sobre o papel do designer e o porvir do design. Para ele, o que irá mudar é a visão das empresas com relação ao marketing e a distribuição dos produtos, visto que tudo se transformou nos últimos dez anos: a comunicação, o surgimento do social, a redução das revistas nas bancas. No futuro, de acordo com Laviani, as pessoas deverão ser atraídas pelos produtos por amor, por paixão. “O futuro do design é fazer as pessoas se enamorarem do seu produto. Fazer as pessoas levarem aquilo por causa do significado especial que ele tem para ela”, finaliza. - Fotos, vídeo e edição de imagens: Rafa Jacinto. Imagens adicionais: arquivo Studio Laviani, Fratelli Boffi e Andrés Otero.